Massapê (Lado A): As cordas do universo pertencem a São Salvador!

E lá vamos nós novamente falar sobre o Coletivo Candiero.

Dia desses lançaram Massapê (Lado A), um EP encabeçado pelo Ramon Souza e Julhin de Tia Lica. A regionalidade está lá em praticamente todos os segundos do registro, mas uma coisa que me deixou pensativo foi a propriedade como que os artistas trabalham com a cultura. Das faixas, três incentivaram a análise e comento brevemente sobre elas:

 

Lá na Feira

O arrastapé de “Lá na Feira” não poderia traduzir melhor o clima de uma feira popular nordestina. Quem conhece esse cenário que vai da gritaria das negociações às pregações ao ar livre, vai se reconhecer na narrativa cantada por Ramon. A história contada é fé aplicada na vida, na rotina muitas vezes banal, onde é possível lembrar da Palavrantiga onde “o dia todo é transparência pra essa graça”.

Bulandeira

“Bulandeira” é a latinidade expurgada dos templos. Se o Brasil mal se reconhece como latino, o que dirá da igreja? É urgente a necessidade dos artistas cristãos tirarem a atenção um pouco do exterior ou do sudeste e voltar seus os olhos para a riqueza cultural que há, por exemplo, no norte do nosso país. É festa, é vida pra celebrar o Rei!

Apocalipse de Angola

“Apocalipse de Angola” emudece evangélicos. Certeza que o coletivo pode receber muitas críticas rasas por essa faixa. Quase uma extensão de “Canto Escravo“, Julhin evoca a ancestralidade sem medo e se faz alvo para subverter o louvor “angelical”. O berimbau entoa cantos da negritude, da capoeira e faz um mix com o universo que está sendo criado pelo coletivo. O tom crescente explode não só nos ouvidos, mas no coração. Tão místico como o apocalipse de C.S. Lewis em Nárnia. Marat Sá Calmará!

Confira nosso review sobre Auto do Céu, do Julhin de Tia Lica.

Enquanto vemos muitos artistas do gospel apenas se apropriando de um gênero musical, produzindo algo genérico visando popularidade ou intenções comerciais, em Massapê é possível perceber que as referências apenas afloram daquilo que corre no sangue e na história desses artistas. Isso mais do que legitima, inova. Algo autoral que não emula um senso comum da lírica aos sons. Mais um grande acerto desse presente-futuro Candiero.