De passagem pelo Facebook, vi uma publicação do Gladir Cabral falando sobre a interpretação que fizeram da sua canção “Martinho Lutero Negro”. Ao clicar, descobri os paraibanos da Prumo.
Bastaram 5 segundos para ter a certeza de estar ouvindo um dos melhores sons que já conheci. Antes fosse exagero falar isso, mas foi a simples constatação de como a música cristã brasileira poderia ser.
Originalidade é pouco para falar da Prumo. Do sotaque à percussão, a banda traz um tesouro em formato de EP. Homenageando o mestre Gladir, o grupo reinventa quatro de seus clássicos.
“Por que essas canções? Porque elas anseiam uma vida melhor; são esperançosas. Nosso disco, que ainda lançaremos, canta sobre isso, por isso a proximidade do diálogo da gente com o Gladir Cabral.”
Prumo – 4 Dec: Um breve review
Na versão para o YouTube, o disco começa com Poema, uma declamação das palavras de Damião Oliveira em crítica ao racismo, à trajetória negra envolta de preconceitos e explorações e que, apesar de todas as diferenças, somos irmãos independente da cultura ou cor da pele. Um início que dá o tom crítico e nível de profundidade do trabalho.
A primeira faixa musical nada mais é do que Casa Grande. Com suas guitarras e batuques, a canção – que já é um clássico -, foi revestida de uma brasilidade negra, raiz, cheia de sentimento e drama. Em vários momentos da faixa, me veio a referência dos pernambucanos da Cordel do Fogo Encantado. O vocal bem no espírito do Lirinha, traz uma interpretação singular, contagiante que faz o ouvinte mergulhar no feeling transmitido pelo grupo.
Em seguida temos Martinho Lutero Negro, a faixa que me foi cartão de visita. Com um vocal feminino deslumbrante, essencialmente nordestino, a faixa que, por si só, é um espetáculo à parte, potencializa seu teor fazendo um fusão entre tempos históricos e culturas. Falando sobre a inspiradora trajetória de Martin Luther King, a canção conecta realidades ainda mais em tempos políticos tão turvos como estamos passando.
A terceira faixa é mais um clássico da música cristã, O Verbo. O que já era emocionante em sua versão original, ganhou uma intensa dose dramática que eleva ainda mais a dimensão da arte.
Infelizmente (apenas 04 faixas), por fim, temos Pasárgada, um deleite para os amantes da Literatura. Fazendo menção ao brilhante poeta recifense Manuel Bandeira, a faixa também nos convida para fugir, para ir ao lugar de paz: Nárnia, Oz, Atlântida… Em um suave tom festivo, a canção consegue transmitir a ternura da composição, encerrando o trabalho com um desejo por mais.
Tão empolgado com o que ouvi, fui atrás do grupo e consegui uma entrevista massa que você pode conferir a seguir:
Entrevista com a banda Prumo
Apenas Música: Para começar, gostaríamos de conhecer melhor vocês. Quem está por trás da Prumo e qual o histórico musical de cada um?
Prumo: Por trás da Prumo estão três caras: Filipe da Guia, Marcellus Alexandria e Damião Oliveira. Todos começamos a tocar na adolescência, na igreja, influenciado por familiares e amigos. Filipe e Marcellus são estudantes de Música da Universidade Federal da Paraíba e atuam em bandas de João Pessoa – Filipe tem um Duo de música instrumental e já tocou com a Flotilha em Alta Terra e Nathalia Bellar; Marcellus toca em pubs com várias bandas e fez parte de Os Nonatos. Damião é formado em História e músico e compositor da Prumo.
AM: “4 músicas do Gladir Cabral. 4 interpretações lindonas. 4 décadas.” Contem pra gente um pouco sobre a ideia de produzir esse EP. E o que o Gladir representa para vocês?
Prumo: Conhecer Gladir, Stênio Marcius, Jorge Camargo, João Alexandre e cia, mexeu demais com a gente, sabe?! Desde o começo da nossa banda gostamos de tocar nossas composições nas igrejas, mas também o que íamos conhecendo. Quando ensaiávamos as canções, fazíamos versões diferentonas… pegávamos algumas coisas do Stênio e colocávamos um rock and roll maroto. Foi assim que pensamos em homenagear esses caras, o Gladir Cabral foi o primeiro e, para nós, ele representa um apontar de novos caminhos, de novas viagens e novas histórias. 4 Dec é uma abreviação de 4 décadas, é uma clara homenagem a Gladir que, em 2018, fez 40 anos de carreira.
AM: Quais as referências musicais para essa releitura tão impressionante?
Prumo: Música Nordestina com certeza: Cabruera, Chico Correia, Siba, Nação Zumbi e Mombojó são algumas referências; tem também influências do jazz como Pedro Martins, Hermeto Pascoal e Hamilton de Holanda; e da música instrumental brasileira em geral.
AM: De quem é a voz feminina em “Martinho Lutero Negro”? Como foi o processo de criação dela?
Prumo: A voz é de Jessica Cardoso, uma cantora proeminente da nossa cidade – e esposa do baterista do disco, Iago Peregrino. Criamos essa versão na garagem de Filipe e foi dele que surgiu a ideia de a música ter um cheiro de blues, uma cor de negro americano, entende? Hahaha. O processo criativo, para nós, é sempre coletivo: alguém pode até guiar, mas tem dedos de todos em todo o EP.
AM: Deveria ser algo normal em nossa música, mas a brasilidade do som de vocês é algo que muito se destaca. Como observam a carência da cultura nacional nos púlpitos e na música cristã brasileira?
Prumo: Acreditamos que o desinteresse e a falta de oportunidade são os fatores que mais afastam a igreja da música que é produzida com mais autenticidade. Por exemplo, Gerson Borges fez um CD dedicado a oração! Poxa, esse CD não toca na rádio, sabe, não tem grandes investidores por trás dele e, por isso, poucas pessoas conhecem. Existe suprimento para a carência, aos poucos a liberdade da internet tem feito esse suprimento chegar aos carentes. Foi assim conosco e pode ser assim com mais pessoas.
AM: Como está o cenário musical paraibano? Destacam nomes para nós?
Prumo: Nosso cenário vem crescendo bastante. No cenário cristão destacamos dois nomes: João Manô – que está prestes a lançar um CD indie folk ‘lindasso’ – e Marco Telles – que já gravou vários álbuns e muito nos influenciou a meter a cara e cantar o que é nosso mesmo. Tem mais… A banda Flor de Pedra, que tem uma sonoridade peculiar demais, Banda-Forra e Survivant são alguns nomes que destacamos. (Exceto o Manô, todas as bandas estão nas plataformas digitais…dá pra procurar e fazer uma playlist massa, hahaha).
AM: Mais que música, no Instagram de vocês, vocês provocam reflexões sociais a partir da canção “Martinho Lutero Negro”. Como vocês vem o papel de bandas/músicos para além dos palcos?
Prumo: A maior parte do nosso tempo é gasto ordinariamente: trabalhando, vivendo, correndo, descansando, sofrendo, rindo…A vida do brasileiro comum. Sendo assim, temos opiniões sobre quase tudo da vida. Nessa efervescência e turbilhão político do nosso país, nossos textos só vieram para poetizar e apontar para o lugar de onde achamos que vem a solução.
AM: Como tem sido a receptividade do som de vocês? Alguma resistência?
Prumo: Até agora nenhuma resistência (não que saibamos, hahaha), e a receptividade tem sido ótima. As pessoas estão ouvindo, compartilhando…outro dia um seguidor até fez um vídeo cantando uma canção nossa…ficamos felizes demais!
AM: Podemos esperar mais derivados de 4 Dec? Vídeos? Turnê? Novas canções?
Prumo: Talvez façamos outras releituras de pessoas que curtimos, ou um EP só com Salmos. Quanto a vídeos, estamos finalizando dois Lyrics lindos que já já estarão no ar. Turnê é uma vontade, quem sabe. Apesar de acabarmos de lançar o 4 Dec, nós já estamos gravando outro projeto, dessa vez só com produções autorais. Então, aguardem, vem coisa muito boa por aí!
Ouça Prumo – 4 Dec EP
Você pode encontrar a Prumo aqui: Instagram | Facebook | Youtube | Spotify | Deezer
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